9.1.07

Design de interação - resenha do cap. 1

Neste post inicio a resenha do livro "Design de interação: além da interação homem-computador" de Jennifer Preece, Yvone Rogers e Helen Sharp (Vejam post anterior sobre o livro).

Resenha do Capítulo 1 - O que é design de interação?

As autoras começam o livro definindo o conceito de design de interação: “design de produtos interativos que fornecem suporte às atividades cotidiana das pessoas, seja no lar ou no trabalho”. Dessa definição já podemos observar que as autoras tratarão no livro de amplo espectro de temas, o que fica explícito quando são indicadas referências para estudos futuros em diversas áreas (sistemas de informação, computação, gerência de projetos, ciência cognitiva, psicologia), todas envolvendo a forma como as pessoas se comunicam e se interagem.

Os projetos de interação devem focar um ponto crucial: desenvolver produtos utilizáveis, ou seja, fáceis de aprender, eficazes no uso e que proporcionem uma experiência agradável para quem o utilizará. Inclui-se aí os produtos de informação, como sistemas web. Para exemplificar essa idéia, as autores mostram a diferença entre dois sistemas de secretária eletrônica:

1. Um sistema de um hotel, acessado por telefone. Neste caso, ao entrar no sistema, o usuário deve digitar o número do quarto. Ok, ele digita e escuta uma mensagem para ele deixar uma mensagem para aquele quarto! O usuário deve, então, ler as instruções em um cartão. Ele descobre que deve digitar o número do quarto mais a tecla “#”. Ele faz isso, mas o sistema pede a senha. O usuário pensa que é o número do quarto, mas não é! Ele se desespera, desiste e liga para recepção.

2. Um sistema baseado em esferas. Para cada mensagem, uma esfera é enfileirada seqüencialmente. Quando a esfera é colocada no orifício da máquina, a mensagem é acionada a mensagem gravada. Em seguida, pergunta-se o usuário gostaria de disca para o número da mensagem. Caso positivo, ela disca automaticamente.

Qual a diferença entre os dois sistemas? O primeiro é chato, complicado, difícil de se aprender, ineficiente e ineficaz. O segundo, mesmo que hipotético, é simples, fácil de aprender e muito eficiente, pois exige pouco esforço do usuário. O sistema 2 foi projetado por Durrel Bishop, com o objetivo de criar uma interface baseada em objetos comuns. Mas o design sempre depende do usuário: a secretária das esferas seria uma catástrofe em uma casa com crianças pequenas!

Desse modo, o design de interação deve considerar quem utilizará o produto e as atividades que devem ser executadas. Podemos pensar dessa forma projetando desde geladeiras até sistemas para celulares.

Para as autoras, a questão central é “como você otimiza as interações do usuário com o sistema, ambiente ou produto, de forma que combinem com as atividades que estão sendo estendidas ou recebendo suporte?” Devemos então refletir sobre:

1. o que as pessoas sabem fazer (ou não);
2. como o produto pode ajudar as pessoas a realizarem suas tarefas;
3. como o produto pode oferecer uma interação de qualidade com o usuário;
4. entender o que os usuários querem e precisam;
5. utilização de técnicas consagradas

A partir dessa reflexão, as autoras propõem um processo de design de interação:

“1. Identificar necessidades e estabelecer requisitos.
2. Desenvolver designs alternativos que preencham esses requisitos.
3. Construir versões interativas dos designs, de maneira que possam ser comunicados e analisados.
4. Avaliar o que está sendo construído durante o processo.”

Esse processo é crucial para o sucesso da interação, pois garante o atendimento sistemático das necessidades e sua avaliação. É importante também considerar sempre a participação dos usuários durante todo o processo. As autoras sugerem também a sistemática documentação do projeto como um todo, desde a usabilidade até as metas específicas dos usuários.

Por falar em metas, um ponto crucial do livro é a diferenciação entre metas de usabilidade e metas decorrentes da experiência do usuário. As primeiras se referem às métricas objetivas de usabilidade, enquanto as segundas à qualidade da experiência do usuário.

As metas de usabilidade envolvem as seguintes metas:

- eficácia: o design deve cumprir seu objetivo;
-eficiente: o design deve cumprir seu objetivo da forma mais rápida e econômica possível, ou seja, de forma produtiva;
- segurança: não ameaçar o usuário durante o uso, evitando colocá-lo em situações indesejáveis ou induzi-lo a cometer erros graves;
- utilidade: as funções do design são apropriadas a seus objetivos, sem exceder as necessidades?
- facilidade de ser aprendido: é fácil e rápido para o usuário entender e aprender como funciona o produto?
- facilidade de se lembrar como se usa o produto: quais são os mecanismos que fazem com que os usuários lembrem rapidamente como usar o produto?

As metas decorrentes da experiência do usuário consideram se os produtos são satisfatórios, bonitos, agradáveis, divertidos, interessantes, motivadores, incentivadores e emocionalmente adequados. Essas características estão em constante evolução e dependem do produto que será desenvolvido, como um jogo, por exemplo, e daquilo que o usuário espera do design. O desafio está, então, em conciliar uma experiência agradável e ao mesmo tempo de melhor usabilidade. Tipicamente, os designers se encontram nesse dilema: às vezes uma interface agradável se torna mais complexa. Por outro lado, a extrema simplicidade pode tirar o interesse pelo produto. Esse dilema deve, e só pode, ser resolvido para cada contexto de uso

Um outro modo de tratar a usabilidade, conforme apresentado pelas autoras, são os princípios do design, que nada mais são que convenções preestabelecidas. A principal referência na área é o livro “The design of everyday things” de Don Norman. Os principais são:

1. feedback e visibilidade: os resultados do uso do produto são claramente visíveis pelo usuário? Esse é um problema grave para a web, pois são vários os sistemas que não retornam respostas e deixam os usuários perdidos.

2. restrições: são formas de restringir o tipo de interação. Por exemplo, um cartão de uma câmera digital só encaixa em u formato, restringindo seu uso em qualquer câmera. As restrições podem ser físicas (como o exemplo supracitado da câmera), lógicas (relacionadas ao entendimento do usuário sobre o funcionamento de um produto (por exemplo, um botão não clicável) e culturais, como sinais reconhecidos por todos (no caso das placas de trânsito).

3. mapeamento: refere-se à relação do produto com seus efeitos, como ocorre nas teclas de controle de um DVD, onde o comando “play” e o comando “foward“ normalmente aparecem na mesma direção, pois possuem um efeito “real” semelhante.

4. consistência: as interfaces devem possuir ações semelhantes, o que acontece em várias versões de um mesmo software, ou ainda o clique com o botão direito do mouse implica mostrar um menu de opções. A consistência, contudo, não pode ser uma barreira para melhorias nos produtos.

5. affordance: se refere à característica de um objeto de possibilitar às pessoas saber como utilizá-lo. Um teclado, por exemplo, convida o usuário a clica-lo naturalmente. Outros produtos, como um automóvel, requerem mais tempo de aprendizado, contudo, uma vez aprendido, ele se torna fácil de ser lembrado. Um ícone ou um botão em um sistema web também nos convidam a clica-los (por isso que às vezes ficamos bastante decepcionados com sistemas web). Na internet, o conceito de affordance está relacionado às convenções encontradas pelos usuários, que “esperam” um determinado comportamento de determinados elementos.

Esses princípios, quando aplicados na prática, são chamados de heurística, como forma de avaliação de designs. O famoso Jacob Nielsen, levantou 10 princípios para a usabilidade de websites por meio da avaliação heurística:

1. o sistema deve manter sempre os usuários informados do que está acontecendo e onde eles estão;
2. o sistema deve seguir a linguagem do usuário;
3. permitir aos usuários saírem rapidamente de situações inesperadas;
4. utilizar padrões, evitando que o usuário tenha que pensar no que fazer;
5. ajuda aos usuários para identificar erros;
6. prevenir e antecipar erros;
7. reconhecer no lugar de memorizar;
8. fornecer aceleradores invisíveis à navegação;
9. evitar o uso de informações irrelevantes que poluem os websites;
10. fornecer ajuda constante e fácil ao usuário.

Como podemos perceber, esses princípios traduzem para o plano prático da web o que foi discutido anteriormente.

A partir desses conceitos, as autoras constroem toda a argumentação no livro, como veremos nos próximos posts.